*Por Pedro Ramos
O Brasil precisa de um marco regulatório para impulsionar o empreendedorismo de inovação no país. E este é o único caminho possível se queremos consolidar os avanços sociais e econômicos das últimas décadas.
Em avaliações promovidas por organismos internacionais, somos um péssimo país para empreender. Segundo o ranking do Banco Mundial, ficamos em 175o quando o assunto é começar um novo negócio, e o 123o no quesito facilidade de desenvolvê-los. Na avaliação do Global Entrepeneurship and Development Institute, somos a 98o economia para se empreender. Em verdade, nem é preciso ser especialista para perceber isso na prática.
Temos graves burocracias para abertura e fechamento de empresas. Nossas estruturas societárias não dão segurança jurídica para investidores. Há mais incentivos para investir em fundos imobiliários, que favorecem concentração de renda e propriedade, do que para investir em empresas nascentes, que distribuem riqueza com maior geração de empregos. Aliás, a própria noção de investidor qualificado – pessoas físicas e jurídicas que possuem aplicações financeiras em valor igual ou superior a um milhão de reais – afasta qualquer possibilidade de termos, de fato, uma democratização do financiamento à inovação.
O acesso a crédito bancário para startups é praticamente inexistente, e o paradigma do Estado enquanto financiador do empreendedorismo já mostrou esgotamento. Não temos leis que deem segurança para pequenas empresas oferecerem planos de stock option. Para completar, países como EUA, Itália e, em breve, Argentina, possuem legislações que incentivam estrangeiros a montarem startups nesses países, reforçando uma tendência de fuga de talentos brasileiros.
E mesmo assim insistimos em desenvolver um ecossistema de empreendedorismo tecnológico. Somo um celeiro de brilhantes profissionais, em que se destacam empresas que, contra todos os prognósticos, buscam inovar em diversos ramos de negócio. Junto dessas startups, surgiu um ambiente institucional jovem, engajado e talentoso: aceleradoras, investidores-anjo, associações, entidades de fomento, fundos e universidades uniram-se em um projeto para potencializar a inovação no país, e que vem teimosamente enfrentando todo o bom-senso regulatório vigente.
E tudo isso surge porque, afinal, este é o único caminho possível. Na economia global, o país não tem vocação para nos diferenciar com custos de mão de obra – impossível competir com países asiáticos. Temos um papel relevante na exploração de recursos naturais, e com os dias contados. Resta, então, o caminho da inovação: desenvolver novos produtos, serviços e tecnologias que vão melhorar a vida das pessoas, aumentando suas capacidades e expandindo as liberdades substantivas dos indivíduos.
Para tanto, o Brasil precisa de um marco regulatório coerente e articulado, que possa atualizar dezenas de diplomas jurídicos de 30, 40 anos atrás. Precisamos re-regular o mercado, introduzindo normas que possam incentivar a competição e desburocratizar o sistema, garantir previsibilidade e reforçar o papel de empresas nascentes como motor de um desenvolvimento sustentável, diverso e descentralizado.
Esses instrumentos devem prever, no mínimo, questões como abertura facilitada de empresas, simplificação das sociedades anônimas, limitação de responsabilidade de investidores, isenções tributárias, incentivos fiscais para investimento-anjo, incentivos à remuneração via stock options, acesso a crédito bancário, entre outras iniciativas. E a maneira eficiente de fazermos isso é por meio de um movimento coerente, aglutinado, que possa criar um diálogo produtivo entre poder público e sociedade.
Se em 2014, após um processo legislativo inédito na democracia brasileira, o país tornou-se referência mundial com a aprovação do Marco Civil da Internet, agora está mais do que na hora do empreendedorismo brasileiro ter seu Marco Civil.
* Pedro Ramos é advogado, mestre pela FGV/SP e Conselheiro do Dínamo. O Dínamo é um movimento de articulação na área de políticas públicas focada no tema ecossistema de startups, e acredita na importância de um marco regulatório para o empreendedorismo no Brasil. Saiba mais em www.dinamo.org.br .